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A mostrar mensagens de junho, 2025

CRÓNICA – AMOR COM PREÇO: QUANDO O NAMORO É UM NEGÓCIO

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 Por Miguel Vicente Datchuplam Era uma vez o amor, mas agora é contrato. Hoje, namorar virou investimento. Há quem procure um parceiro como se escolhesse um banco: estabilidade, rendimento e status. Os sorrisos já não vêm do coração — vêm do bolso recheado. Os jantares românticos? Estratégia. As palavras doces? Cartas de negociação. Vivemos tempos em que o interesse se disfarça de afeto. Onde há mais "o que tens?" do que "quem és?". As redes sociais tornaram-se vitrines de um amor maquiado: viagens pagas, roupas de marca, selfies ensaiadas. Tudo para manter a ilusão. No fundo, é um namoro por conveniência. É querer a pessoa não pelo que ela é, mas pelo que ela pode oferecer. E quando a fonte seca — o amor evapora. Sem presentes, sem viagens, sem transferências bancárias, o coração que dizia "te amo" de repente não sente mais nada. Porque nunca sentiu. Porque nunca foi amor — foi contrato com data de validade. Nos becos das cidades, há corações partidos que...

O MUNDO PRECISA DE PAZ E NÃO DE GUERRAS

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Vivemos num tempo em que os gritos das bombas abafam as vozes da razão. A humanidade, tantas vezes dividida por fronteiras, interesses e ódios antigos, esquece que somos todos feitos do mesmo sangue, do mesmo medo, da mesma esperança. O mundo precisa de paz. Uma paz verdadeira, construída com justiça, diálogo e empatia. Não uma paz imposta pela força, mas uma que floresce do respeito mútuo, do direito à dignidade e à vida. As guerras — sejam armadas ou silenciosas — só semeiam luto, fome e destruição. Nenhuma bala ensina o amor. Nenhum tanque constrói um futuro. Cada vez que uma criança morre num campo de batalha, morre um pedaço da nossa humanidade. Cada vez que um povo é silenciado, cala-se a liberdade do mundo. Precisamos reaprender a olhar uns para os outros com compaixão, a resolver conflitos com palavras e não com pólvora. A paz não é uma utopia distante. Ela começa em pequenos gestos: no respeito às diferenças, no cuidado com o outro, no compromisso com a verdade e a solidarieda...

RENAJ E OS PARTIDOS POLÍTICOS: ENTRE A REPRESENTAÇÃO JUVENIL E O JOGO DO PODER

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A juventude guineense, tantas vezes celebrada nos discursos e ignorada nas decisões, vive no limiar entre a esperança e o cansaço. No meio desta tensão social e política, a RENAJ – Rede Nacional das Associações Juvenis da Guiné-Bissau surge como uma plataforma que deveria representar os interesses da juventude, mobilizar consciências e construir pontes para o futuro. Mas a pergunta que ressoa entre os becos das cidades e os trilhos do interior é inquietante: para quem serve a RENAJ hoje? Para os jovens ou para os partidos políticos? É inegável o papel importante que a RENAJ pode ter na promoção da cidadania ativa, no empoderamento juvenil e na defesa dos direitos sociais. Em teoria, é uma rede independente, plural, apartidária. Mas na prática, há sinais preocupantes de instrumentalização política, onde a juventude se transforma em escada para a ascensão de lideranças partidárias ou em massa de manobra durante campanhas eleitorais. A relação entre a RENAJ e os partidos políticos tem sid...

Juventude: A Força Vital da Paz

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A juventude representa mais do que uma faixa etária — ela é esperança, movimento e transformação. Na Guiné-Bissau, um país marcado por instabilidades políticas, tensões sociais e desafios económicos, os jovens surgem como protagonistas incontornáveis na construção da paz e da democracia. Durante décadas, os jovens guineenses foram vistos apenas como beneficiários das políticas públicas. Hoje, exige-se um novo olhar: eles são agentes ativos da mudança. Nos bairros, nas universidades, nas organizações da sociedade civil e até nos meios digitais, a juventude vem dando voz aos silêncios e levantando as bandeiras da justiça social, da reconciliação nacional e do desenvolvimento sustentável. A paz não é apenas a ausência de guerra. É também a presença de oportunidades, de diálogo intergeracional, de inclusão e de esperança concreta. Quando um jovem tem acesso à educação, emprego digno e participação política efetiva, está-se a construir um pilar sólido para a paz duradoura. Nas recentes inic...

Ensaio

Estudo sem Trabalho na Guiné-Bissau: Entre a Formação e o Desemprego Juvenil Autor: Miguel Vicente Datchuplam Licenciado em Ciências Políticas e Relações Internacionais --- Sumário 1. Introdução 2. A Expansão do Ensino e o Sonho da Mobilidade Social 3. Causas Estruturais do Desemprego Juvenil Qualificado 4. Impactos Sociais e Psicológicos 5. Propostas e Caminhos Possíveis 6. Conclusão 7. Referências --- 1. Introdução A juventude representa um dos pilares fundamentais para o desenvolvimento sustentável de qualquer nação. Na Guiné-Bissau, apesar de avanços no acesso à educação, assiste-se a um fenómeno crescente: a formação de jovens sem a correspondente integração no mercado de trabalho. Esta situação levanta preocupações não apenas em termos económicos, mas também sociais e políticos. O presente ensaio analisa o paradoxo entre a educação e o desemprego juvenil, identificando causas estruturais, consequências sociais e caminhos possíveis para reverter este cenário que afeta diretamente ...

CRÔNICA POLÍTICA

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                     Parlamento Vazio  Na Guiné-Bissau, o Parlamento é uma casa grande demais para a pouca presença que abriga. O povo, que há muito perdeu o hábito de esperar, olha de longe o edifício onde, teoricamente, se decide o seu destino. E cada vez mais compreende: ali não se decide nada — ou, pior, decide-se tudo sem ele. Os assentos ficam vazios, não só de deputados ausentes, mas de ideias e de respeito pela pátria. Sessões adiadas, plenários suspensos, crises atrás de crises, como um teatro mal ensaiado em que os actores já não sabem a sua fala, e o público já não acredita no enredo. A ausência de debates sérios, o abandono dos compromissos eleitorais, a banalização da instabilidade política — tudo isso mina o pouco que resta da confiança popular. O Parlamento deveria ser espelho do povo, mas reflete apenas vaidades, lutas de interesse e um silêncio cúmplice com a decadência. Enquanto os representantes se ausentam, ...

CRÓNICA DESPORTIVA

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Djurtus: Entre o Fracasso e a Desorganização Os Djurtus, nome que enche de orgulho qualquer guineense ao evocar a bravura da nossa seleção nacional de futebol, atravessam uma fase conturbada. Entre o entusiasmo do povo e as realidades cruas dos bastidores, fica evidente: a nossa seleção está presa entre o fracasso desportivo e a desorganização institucional. O Fracasso que Vai Além do Campo Não se trata apenas de derrotas em campo. Perder é parte do jogo, mas quando as derrotas se tornam rotina e refletem falta de estratégia, má preparação e visível desmotivação dos jogadores, é preciso ir além das desculpas habituais. O talento individual existe – e não é pouco. Temos jogadores espalhados por clubes internacionais, com qualidade e vontade. Mas talento sem estrutura é como um leão acorrentado: forte, mas inofensivo. A Desorganização como Padrão A ausência de um plano sério de desenvolvimento do futebol nacional é gritante. Faltam campos, equipamentos, apoio logístico, salários pagos a ...
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  Lágrimas de Céu Azul Chora o céu sobre Bissau, tão azul, tão ferido, Cada lágrima carrega um grito escondido. Da lida cansada à mesa vazia, É o povo que sofre — mas não se esvazia. Criança que corre sem sapato no chão, Sonha com cadernos e pão na mão. Mãe que canta pra calar a dor, Transforma tristeza em cantiga de amor. O mar conhece cada lágrima que cai, Do pescador calado que nunca trai. Ele lança sua rede, mesmo sem certeza, Pois esperança é sua maior riqueza. Homens e mulheres, de olhar resistente, Com passado quebrado e fé persistente. Suas mãos calejadas, seu passo lentil, Caminham sob um céu de um azul infantil. Mas o azul, mesmo em pranto, não desiste, Porque sabe que esse povo ainda resiste. E nas lágrimas que molham a terra do chão, Floresce a força de uma nova geração. Miguel Vicente Datchuplam 

O MEU PAI E A SUA PARTIDA

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 Tenho apenas duas primaveras quando o meu pai parte. É tão cedo que não tenho memórias suas, nenhuma imagem guardada em fotografias, nenhum riso ou gesto seu para recordar. Ele simplesmente desapareceu da minha vida antes mesmo que eu pudesse compreendê-lo. Sem fotos, sem histórias contadas por ele, fico preso a um silêncio que fala alto. As pessoas falam do meu pai, mas eu não consigo formar uma imagem clara na minha mente — ele é uma sombra vaga, um nome que soa distante. Essa ausência completa me acompanha como um mistério sem resposta, uma falta que não sei bem como preencher. O que dói não é só a falta física, mas o vazio das lembranças. Não tenho um único momento seu para guardar no coração, nenhum gesto que me faça sentir perto. Cresci com perguntas mudas, com a vontade de entender quem ele foi, por que se foi tão cedo, e o que teria sido se tivesse ficado. Apesar disso, aprendi a seguir em frente, construindo a minha história sem o passado dele para me apoiar. A ausência d...

CARTA ABERTA À MINHA GUINÉ

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 À República da Guiné-Bissau   Aos seus digníssimos filhos e filhas,   À sua memória, presente e futuro.   Assunto: Reflexão sobre o estado da nossa Nação   Prezada Guiné-Bissau,  Dirijo-me a ti por meio desta carta aberta, não apenas como cidadão, mas como filho que carrega no peito a tua dor, os teus silêncios e a tua imensa beleza.  Escrevo-te com respeito, saudade e esperança, com o firme propósito de dialogar contigo, mesmo que simbolicamente, sobre o que és, o que foste e o que, juntos, podemos ser.   És uma pátria rica em história, cultura e resistência. Do espírito de Amílcar Cabral à força do povo que luta todos os dias pela sobrevivência, tens demonstrado ao mundo a tua coragem.  No entanto, é impossível calar a preocupação que me assombra ao ver-te ainda marcada por instabilidades políticas, promessas vazias e ausência de serviços básicos que garantam dignidade ao teu povo. Numa terra onde tantos morrem s...

A fuga dos quadros na Guiné-Bissau

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Por Miguel Vicente Datchuplam  A fuga dos quadros tem sido um dos maiores desafios que a Guiné-Bissau enfrenta. Jovens formados, cheios de sonhos e com vontade de contribuir para o desenvolvimento nacional, acabam por abandonar a pátria em busca de melhores condições de vida no estrangeiro. Essa realidade dolorosa empobrece ainda mais a nossa nação, não apenas em termos económicos, mas sobretudo em termos humanos e intelectuais. Num país onde os recursos naturais abundam, mas as oportunidades escasseiam, a frustração cresce. Muitos quadros recém-formados deparam-se com a falta de emprego digno, salários baixos, ausência de incentivos e uma administração pública marcada pela corrupção e favoritismo. Como esperar que esses jovens permaneçam se não são valorizados nem respeitados? A fuga dos cérebros representa uma perda dupla: investimos na formação desses profissionais e depois perdemo-los para países que reconhecem o seu valor. Médicos, professores, engenheiros, juristas — todos fo...

A REINANÇA DOS MACACOS NAS MATAS DE CANTANHEZ

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Uma fábula sobre o poder, a opressão e a revolta Há muitos e muitos anos, nas densas matas de Cantanhez, na Guiné-Bissau, viviam animais de diferentes espécies. Mas, apesar da diversidade, a floresta era governada apenas por macacos. Nessa república de democracia falhada, os animais viviam oprimidos, silenciados pelo medo. Opinar era perigoso, mesmo quando se tinha razão, porque o Rei Macaco era o “dono disto tudo”. Queria controlar tudo, das decisões mais pequenas às mais importantes. O Conselho dos Anciãos, que antes representava a sabedoria da floresta, tornara-se apenas uma extensão da sua vontade. A justiça? Era surda para os fracos. O medo habitava todos os cantos da mata. O Rei gabava-se de tudo. Dizia-se bonito — tão belo quanto uma mulher formosa — e orgulhava-se do seu poder. Mas, enquanto ele se vangloriava e enriquecia, os outros animais definhavam na miséria, com fome e desespero. Não se importava com a vida alheia. Raptos, espancamentos, silenciamentos: quem ousasse dizer...