A REINANÇA DOS MACACOS NAS MATAS DE CANTANHEZ
Uma fábula sobre o poder, a opressão e a revolta
Há muitos e muitos anos, nas densas matas de Cantanhez, na Guiné-Bissau, viviam animais de diferentes espécies. Mas, apesar da diversidade, a floresta era governada apenas por macacos. Nessa república de democracia falhada, os animais viviam oprimidos, silenciados pelo medo. Opinar era perigoso, mesmo quando se tinha razão, porque o Rei Macaco era o “dono disto tudo”. Queria controlar tudo, das decisões mais pequenas às mais importantes. O Conselho dos Anciãos, que antes representava a sabedoria da floresta, tornara-se apenas uma extensão da sua vontade.
A justiça? Era surda para os fracos. O medo habitava todos os cantos da mata.
O Rei gabava-se de tudo. Dizia-se bonito — tão belo quanto uma mulher formosa — e orgulhava-se do seu poder. Mas, enquanto ele se vangloriava e enriquecia, os outros animais definhavam na miséria, com fome e desespero. Não se importava com a vida alheia. Raptos, espancamentos, silenciamentos: quem ousasse dizer a verdade acabava com “um grampo no peito”.
Passados seis anos de reinado, a revolta começou a crescer. Os outros macacos, já desiludidos, começaram a murmurar contra o seu Rei. Juntaram-se a animais de outras espécies. A reinança na república dos macacos durava sete anos — e, mesmo no sexto, nada havia mudado. O Rei preocupava-se apenas consigo. Durante todo o seu mandato, visitara mais de dez matas nacionais e mais de noventa matas internacionais. Viajante do luxo, deixava a floresta à mercê da fome.
A esperança foi morrendo.
Então, numa noite de lua pálida, os animais reuniram-se em segredo, aproveitando a ausência do Rei. Decidiram, por unanimidade, cavar um buraco imenso na entrada do palácio. Uma armadilha profunda, coberta por lona e folhas secas. Quem caísse ali, não sairia com vida. Estavam fartos de sofrer.
Na véspera do regresso do Rei, um grupo de elite posicionou-se perto da armadilha: seis leões, quatro lobos, três avestruzes, três onças e seis lebres. Cada um pronto. Cada um atento. A floresta, silenciosa, parecia conter a respiração.
Às 16h, os guardas anunciaram: o Rei estava a caminho.
Ele vinha montado num cavalo, sorrindo de um lado ao outro, ignorando tudo o que se passava no seu reino. Estava no terceiro cavalo de um cortejo de seis. Quando se aproximou da entrada do palácio, com velocidade, o solo traiçoeiro cedeu.
O estrondo do buraco foi seguido de gritos:
— Misericórdia! Misericórdia!... Senhor, tenha piedade de nós!
Mas já era tarde. O Rei e os seus guardas caíram no abismo. Nenhum sobreviveu.
Naquele dia, a floresta vibrou. Animais de todas as espécies celebraram. A esperança, antes adormecida, despertou. Foi um dia de verdadeira libertação nas matas de Cantanhez.
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Moral da história:
> Quando o poder se transforma em opressão, até os mais pacíficos aprendem a lutar. Nenhuma coroa resiste para sempre ao grito da justiça silenciada.
Autor: Miguel Vicente Datchuplam
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